Muitas empresas de tecnologia fazem parte de um “sistema cardiovascular” maior que é a Internet
Cresci nos primeiros anos da internet e me animava com todas as grandes novidades. Diário online? Impressionante! AOL Instant Messenger? Legal! Facebook? Já me registrei! Mas assim como tantas pessoas da minha idade, eu me preocupava mais em não revelar meu nome completo online e clicar em pop-ups estranhos do que proteger meus “dados” ou “privacidade”. Como uma jovem sem conhecimento dos bastidores do setor tecnológico, eu nunca podia ter previsto as formas de evolução da internet, nem quantas informações pessoais eu estaria divulgando no processo.
Nos EUA, enxergamos os dados como um produto; algo que é comprado, vendido e negociado com lucro ou em troca de algum benefício. Mas na Europa, os dados são considerados uma parte fundamental da nossa humanidade. São como pequenos pedaços de nossa personalidade flutuando na esfera digital. Sendo assim, eles precisam ser protegidos, assim como todos as outros elementos pessoais que não divulgamos publicamente.
Quando tento imaginar como meus dados deixaram de ser só meus, vejo um desenho do corpo humano, com pixels se desprendendo e flutuando para o vazio. E isso nos traz de volta ao - corpo. Ao meu corpo. Em vez de me concentrar em aplicativos individuais, como fiz até agora, quero me concentrar no meu corpo. E, mais especificamente, em meus sistemas corporais.
Para começar, darei uma olhada no que a internet sabe sobre meu sistema cardiovascular. Antes de tudo: procure no Google “O que é o sistema cardiovascular?”
O sistema cardiovascular — também chamado de sistema circulatório — é o sistema que transporta sangue por todo o nosso corpo. O sangue transporta nutrientes e oxigênio para locais que os precisam e remove o dióxido de carbono e outros resíduos. Ele também inclui o sistema linfático, que transporta a linfa por todo o corpo. E quando estamos falando de órgãos, o sistema cardiovascular inclui o coração, pulmões, cérebro, rins e todas as veias/artérias/capilares que são essencialmente as estradas usadas para o transporte.
Então, essa é a parte do corpo. Agora falemos sobre a parte tecnológica, começando com o que eu mais gosto de chamar de “aplicativos de autoquantificação”, Fitbit e MyFitnessPal. Eles pertencem às empresas privadas de saúde e fitness e eu me inscrevi, paguei e estou os usando diariamente para monitorar minha atividade e ingestão alimentar.
Ambos os aplicativos sabem minha altura e peso, que podem ser usados para calcular o índice de massa corporal (IMC). Embora eu pessoalmente não ache que o IMC é uma boa medida de saúde, é a medida que muitos médicos usam. Por exemplo, pessoas com IMC acima de um certo limite são classificadas como “obesas do ponto de vista médico”, o que as expõe a muitos problemas com os cuidados de saúde. Portanto, na teoria, meu IMC poderia ser usado “contra” mim se, por exemplo, essa informação caísse nas mãos de uma seguradora de saúde e se ela decidisse que isso revela informações específicas sobre meu sistema cardiovascular.
Da mesma forma, o Fitbit também conhece minha frequência cardíaca (incluindo a frequência cardíaca em repouso, seu valor em qualquer momento e as tendências ao longo do tempo), sendo um bom indicador da saúde cardíaca. Na teoria, essa informação também poderia ser usada em combinação com os dados que meu Fitbit coleta sobre meus exercícios (quais exercícios faço, quando os faço e por quanto tempo, quais mais faço) para descobrir se estou praticando atividades menos saudáveis.
E o MyFitnessPal adiciona uma terceira camada ao bolo: “o que Emma está fazendo com seu sistema cardiovascular”. Porque, já que mencionamos o bolo, o MyFitnessPal sabe quando comi um. Assim como sabe todas as coisas que como e bebo, contanto que eu preencha o pequeno diário alimentar todos os dias.
Portanto, temos minha frequência cardíaca, exercícios e consumo de comida - tudo online. Eu diria que isso fornece uma visão bastante completa do meu sistema cardiovascular neste momento. E não para por aí. Examinarei mais dois serviços que podem prever o futuro da minha saúde cardíaca.
A primeira: MyHeritageDNA. Conforme descrevi ao examinar o MyHeritage, há uma opção de fazer o teste de doenças às quais sou geneticamente predisposta. E, embora, por um lado, isso parece ser uma informação muito importante e interessante, por outro lado, isso, potencialmente, me deixa mais vulnerável aos prêmios de seguro mais altos e afins. O negócio é complicado. Tô fora.
Mas se eu decidisse realmente fazer esse teste, a internet saberia se eu tinha predisposição para diabetes tipo 2 e doenças cardíacas. (Spoiler: Tenho predisposição a um e não a outro. Acho que agora a internet sabe disso também!)
Finalmente, uso o One Medical para os cuidados gerais de saúde. Como a One Medical é uma empresa que combina tecnologia e cuidados de saúde, fornecendo medicina concierge e acesso a prestadores de serviços médicos através de seu aplicativo, você poderia argumentar que a Internet sabe tudo que é possível saber sobre meu sistema cardiovascular. Felizmente, pelo que vejo, a One Medical não vende dados (o que seria antiético e fora de conformidade com a Lei de Portabilidade e Responsabilidade dos Planos de Saúde (HIPAA, na sigla em inglês)) e leva a segurança a sério. Segundo a política de privacidade da empresa:
“Levamos a sério a segurança e a confidencialidade de suas informações pessoais. Seguimos as melhores práticas da indústria em desenvolvimento e testes de software, incluindo a verificação periódica por pesquisadores de segurança internos e externos. Seus dados são criptografados em trânsito e em repouso, e nossa infraestrutura é executada em um data center líder do setor, altamente seguro e compatível com HIPAA.”
Já dei a algumas empresas de internet informações sobre meu sistema cardiovascular - imagine esses pequenos pedaços de dados flutuando, saindo de minhas veias, coração e pulmões e entrando no mundo digital. E embora até agora eu não tenho nada contra nenhuma empresa individual, considerando o que elas coletam e o que fazem com essas informações (com algumas exceções, é claro), examinar essas mesmas informações em vários serviços me deixa... nervosa.
Embora essas empresas não estejam conectadas umas às outras da mesma forma que as partes do meu sistema cardiovascular estão conectadas — ou seja, elas não estão se comunicando diretamente entre si — elas ainda fazem parte do maior “sistema cardiovascular” que é a internet. E se eles usam agregadores de dados de terceiros, então estão potencialmente compartilhando informações sobre mim uns com os outros.
Quero fazer parte desse sistema? Quero que os bits com minhas informações pessoais estejam lá? Não consigo optar por sair do meu sistema cardiovascular e não consigo realmente optar por sair da Internet. Eu poderia parar de usar alguns desses serviços, mas, honestamente, gosto muito deles e acho que provavelmente têm efeito positivo à minha saúde.
Minha saúde física, pelo menos. As questões relativas à minha saúde digital ainda estão pendentes. Pessoal, não consigo avaliar essa questão como categoricamente positiva ou negativa. Acho que todos teremos que esperar mais um pouco para chega a uma conclusão.