Ele sabia que era ridículo, mas também percebeu que colocar os dispositivos online abria um mundo totalmente novo.
Em 1990, havia 3 milhões de pessoas na internet (hoje há mil vezes mais). Embora existissem experimentos, como uma máquina de refrigerante “conectada” na Universidade Carnegie Mellon, não havia dispositivos inteligentes online, pelo menos não da forma que os conhecemos hoje. Havia a Internet Sem Coisas (hoje existem 7 bilhões de Coisas conectadas, sem contar computadores e dispositivos móveis).
Esta é a história da primeira Coisa conectada à internet, seus inimigos secretos, seus recursos limitados e preciosos e o seu legado de longo prazo. Esta é a história de John Romkey e a torradeira Sunbeam Deluxe Automatic Radiant Control, a primeira coisa da Internet das Coisas.
“Era ridículo”, diz Romkey, pioneiro da internet que foi coautor do primeiro conjunto de protocolos de comunicação, que permitia que os computadores da IBM se conectassem à internet primordial, em 1982. “Esse foi um dos motivos para ter feito isso”. Mas existiam motivos sérios, também. O início da Internet das Coisas entrou em destaque neste varão com a TOP SECRET, uma exposição no London Science Museum que apresenta a segurança cibernética e a história da tecnologia.
“Isso mostra que as pessoas sempre gostaram de conectar coisas ridículas à internet”
Romkey fundou a FTP Software em 1986 e sua empresa construiu uma das primeiras implementações de protocolos da internet, o TCP/IP. Em uma feira de informática em 1989, chamada Interop, o organizador Dan Lynch o desafiou a colocar um aparelho online e exibi-lo na feira do ano seguinte. Romkey aceitou o desafio. “Eu queria mostrar o que era possível fazer com os protocolos existentes”, diz Romkey, que hoje trabalha com consultoria e realiza pesquisas em IoT.
Por acaso, escolheram o aparelho perfeito. O Sunbeam Deluxe Automatic Radiant Control (ainda em posse de Romkey) era um dispositivo esperto mesmo antes de ser um dispositivo “inteligente”. “Você coloca o pão dentro dele, o aparelho abaixa o pão e começa a torrá-lo”, diz Romkey. Então, tudo que tivemos que fazer foi controlar a energia da torradeira com um notebook grande e desajeitado e conectá-los entre si. Lembrem-se, não existia Wi-Fi. Depois, poderíamos usar o computador para ligar o aparelho para abaixar e torrar o pão e desligá-lo para interromper a tostagem, levantando o pão”.
Romkey mal sabia que havia forças contrárias, determinadas a acabar com a sua pequena torradeira valente. A primeira coisa da internet mal havia sido colocada no forno e já parecia torrada. “O sindicato que trabalhava na feira ficou muito chateado porque não tínhamos permissão para preparar comida nas dependências. Isso estava no contrato”, diz Romkey. “Mesmo que ninguém estivesse comendo, estávamos quebrando as regras”.
Mas ninguém informou Romkey sobre a ameaça. A equipe só o informou que precisavam continuar usando as mesmas duas fatias de pão, um compromisso que eles fizeram com o sindicato. “Eu só sabia que tínhamos que torrar bem de leve”, diz ele.
E qual foi a reação dos visitantes da Interop de 1990, em San Jose, Califórnia? “As pessoas acharam divertido”, diz Romkey. “Eles adoraram. Pensaram que era interessante”. Mas poucos compreenderam os problemas que, para ele, surgiram durante a sua demonstração da torradeira. “Eu pensava em privacidade e segurança”, diz Romkey. “Quem pode ver sua torradeira online, quem pode controlá-la online?” A torradeira é um dispositivo insignificante (mesmo a torradeira Sunbeam Deluxe Automatic Radiant Control) e seus dados não eram um problema. A menos que você estivesse preocupado de que outras pessoas soubessem quantas torradas eram produzidas. Mas e se alguém conseguisse ligar sua torradeira por 10 horas enquanto você estivesse fora de casa?
A torradeira não funcionava no vácuo (essas apareceram mais tarde). O amigo e colega de Romkey, Simon Hackett, também fez a demonstração de uma torradeira inteligente na Interop e em outros lugares. No ano seguinte, uma equipe diferente construiu um braço de robô para colocar pão em sua própria torradeira inteligente. A Internet das Coisas, no plural, estava chegando.
O que Romkey acha sobre a Internet das Coisas (IoT)? “Tenho sentimentos contraditórios”, diz ele. “Existem possibilidades maravilhosas para a ciência, a medicina, o meio ambiente e a conveniência do dia a dia. E há esses cenários monstruosos que parecem ficção científica, particularmente quando se trata de vulnerabilidades de segurança que são epidêmicas na IoT”.
No final, a primeira coisa da IoT foi pioneira em uma verdade duradoura sobre dispositivos inteligentes na qual Romkey acredita:
“Isso mostra que as pessoas sempre gostaram de conectar coisas ridículas à internet”.
A Top Secret* é uma exposição co-patrocinada pela Avast no Science Museum em Londres, que está em cartaz até fevereiro. A entrada é gratuita, mas é necessário fazer reservas. Mais detalhes e informações podem ser encontrados aqui*.
* Original em inglês.