Quando é correto usar software de rastreamento, e quando não é?

Emma McGowan 8 jul 2021

Como proteger as crianças sem abalar a confiança entre pais e filhos

Que tal examinarmos juntos os softwares de rastreamento infantil? A tecnologia facilitou para os pais saberem onde os filhos estão, 24 horas por dia, 7 dias por semana. E há muitas opções, como softwares ocultos que a criança não sabe que estão instalados ou keyloggers que rastreiam tudo o que é digitado no Find My iPhone. Mas é realmente uma boa ideia usar esses softwares? E qual é a diferença para um stalkerware?

A resposta, de acordo com a psicóloga infantil Catherine Knibbs*, é complicada. Knibbs, que é especialista em trauma cibernético*, conta à Avast que “existe uma enorme diferença entre rastreamento oculto e aberto”.

“Trata-se sempre da intenção”, diz Knibbs. “Quando se trata de stalking, muitas vezes há outra intenção ou modus operandi.” 

Ela também acredita que há certas circunstâncias em algumas famílias em que algum tipo de software de rastreamento é absolutamente necessário. Por exemplo, se houver problemas médicos, como uma paciente que tinha um distúrbio que causa desmaios, ou problemas de desenvolvimento, ou como um paciente que não saberia voltar para casa sozinho. 

“Nessas circunstâncias, sim, porque se trata realmente de cuidar da criança, em vez de ser um pai autoritário”. No entanto, se não houver circunstâncias atenuantes, então “talvez seja um pouco invasivo para essas crianças”, diz Knibbs.

Como falar com seus filhos sobre software de rastreamento

Mas existem inúmeras razões para um pai decidir usar um software de rastreamento no telefone do filho. Se for o seu caso, Knibbs diz que você precisa ter uma ou mais conversas com ele sobre o tema. Embora o foco dessas conversas sejam o software, elas “não são nunca sobre um software”. 

“Não se trata da tecnologia”, diz Knibbs. “Trata-se de relações, de humanidade”. 

Instalar software sem conversar com seu filho sobre isso, diz Knibbs, “cria desconfiança entre o filho e os pais, da mesma forma que nos relacionamentos românticos”.

“Isso é realmente uma violação da liberdade, dos limites e do consentimento”, diz Knibbs. “É traição. E também reforça a ideia de que os pais não confiam neles, então eles começam a fazer as coisas em segredo. No final, não é muito útil”. 

Knibbs recomenda focar no cuidado, em vez de “rastrear”, “perseguir” ou na falta de confiança. Também é importante enfatizar seu papel como pai ou mãe e esclarecer o que seu filho pode esperar. Eles provavelmente não gostarão disso, mas conhecer e manter seus limites e motivos, é essencial.

“É meu trabalho como mãe (ou pai) verificar que você está seguro: legalmente, moralmente, eticamente”, sugere Knibbs. “E se eu não fizer bem o meu trabalho, você pode se machucar”.

Os pais também podem apresentar essa conversa como uma etapa em direção à independência, ao invés de uma restrição adicional na vida de um filho. Knibbs usa o termo “independência facilitada” para descrever o processo de uma criança que se afasta gradualmente dos pais de uma forma segura, confiável e que permite que ela cresça. 

“Você não pode aprender sobre independência até que seja independente”, diz Knibbs. “É como querer aprender a andar na corda bamba, você precisa aprender na prática. Você não pode apenas pensar sobre isso uma vez e, depois, dizer que já sabe andar na corda bamba”.

No caso de um software de rastreamento em um telefone, a independência facilitada pode ser um software que rastreia sempre a localização da criança enquanto ela está no ensino fundamental e se transformar em uma conversa sobre por que mamãe pode usar o Find My iPhone quando uma filha de 15 anos não volta para casa na hora combinada. 

É uma flexibilização gradual e apropriada da idade, do monitoramento digital e da restrição, acompanhada por uma conversa franca e aberta em cada etapa do processo. Esse processo pode ser comparado a outras mudanças nas restrições que acontecem conforme as crianças ficam mais velhas, como um horário mais tarde para voltar para casa ou a possibilidade de sair com os amigos por conta própria.

Um rastreamento com excesso de zelo pode ter efeitos negativos graves

Muitos pais depositam esperança no software de rastreamento, achando que ele protegerá seus filhos como uma cuidadora ou babá digital. Mas, na realidade, o software de rastreamento não pode evitar que algo ruim aconteça ao seu filho. Pode ajudar com as consequências, mas não é uma ferramenta preventiva. 

O rastreamento excessivo ou desnecessário de uma criança pode realmente levar a comportamentos e resultados negativos para ela. E, para ser claro, não estamos falando sobre usar ocasionalmente o Check My iPhone quando um adolescente atrasa para voltar para casa e você está preocupado. Estamos falando sobre softwares secretos que não são informados à criança ou adolescente e que rastreiam constantemente uma pessoa que não tem problemas físicos, psicológicos ou legais, que tornariam o rastreamento essencial para o bem-estar dela.

Por exemplo, uma criança que sabe que o telefone tem um software de rastreamento pode optar por deixá-lo na casa de um amigo ou até mesmo em casa quando sair. Então, se algo acontecer, os pais não conseguirão entrar em contato com ele.

O software de rastreamento também pode prejudicar a capacidade de uma criança ou adolescente de crescer e se tornar independente. Knibbs diz que ter esse tipo de software no telefone pode fazê-los se sentir como se “a mãe estivesse ao lado enquanto ele(a) está com os amigos”. E se os pais dos amigos não estiverem rastreando os filhos, a criança pode achar há algo errado com ela, que faz com que os pais sintam necessidade de rastrear.  

“Deixe-os crescer”, diz Knibbs. “Dê uma chance a eles”.

Knibbs acredita que é possível que crianças que são rastreadas de forma oculta ou excessivamente zelosa por seus pais possam reconstituir esse comportamento com um parceiro romântico no futuro. Como foram rastreados quando crianças, elas podem normalizar o ato de se infiltrar no telefone de parceiro ou verificar se ele está rastreando. 

“O que acontece na nossa infância se transforma em como agimos como adultos”, avisa Knibbs.

É assustador não saber onde seus filhos estão. E é tentador procurar uma solução tecnológica em vez de ter conversas e negociações difíceis com seu filho. Mas, Knibbs diz: “Não se trata de tecnologia. E sim de ser pai ou mãe”. Ou para pensar de outra maneira: Ser pai ou mãe com auxílio tecnológico.


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* Original em inglês.

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